domingo, 22 de novembro de 2009

E SEGUE O VESTIDO ROSA


Não há justificativa moral possível para esse incidente. Ele é um caso claro de violência contra a mulher. (...) A multidão enfurecida não se descreve como algoz. Foi a jovem mulher insinuante quem teria provocado a reação da multidão. Nesse raciocínio enviesado, a multidão teria sido vítima da impertinência do vestido rosa. (...)

Pode causar ainda mais espanto o fato de que a multidão não tinha sexo. Homens e mulheres perseguiam o vestido rosa com fúria semelhante. Há mesmo quem conte que a confusão foi provocada por uma estudante.

Mas isso não significa que a violência seja moralmente neutra quanto à desigualdade de gênero. É uma lógica machista e que alimenta sentimentos de indignação e ultraje por um vestido curto em uma mulher. A sociologia do vestuário é um recurso retórico para encobrir a real causa da violência - a opressão do corpo feminino.

Não é o vestido rosa que incomoda a multidão, mas o vestido rosa em um corpo de mulher que não se submete ao puritanismo.

Não há nada que justifique o uso da violência para disciplinar as mulheres. Nem mesmo a situação hipotética de uma mulher sem roupas justificaria o caso. Mas parece que uma mulher em um vestido insinuante provoca mais fúria e indignação que a nudez. O vestido rosa seria o sinal da imoralidade feminina, ao passo que a nudez denunciaria a loucura. A verdade é que não há nem imoralidade, nem loucura. Há simplesmente uma sociedade desigual e que acredita disciplinar os corpos femininos pela violência. Nem que seja pela humilhação e pela vergonha de um vestido rosa.

Debora Diniz

Antropóloga e professora da UnB
(Do sítio de Luciano Pires)

Nenhum comentário:

Postar um comentário